O direito a informação nas relações de consumo
Autores
Resumo
A pesquisa analisa a importância do dever de informação nas relações de consumo. Através de informações claras e considerando a vulnerabilidade informacional e comportamental do consumidor é possível garantir o entendimento das cláusulas e dos compromissos estabelecidos na relação de consumo firmada. A clareza semântica do acordo afasta a assimetria informacional entre as partes evitando a aplicação das normativas protetivas do Código de Defesa do Consumidor no caso de descumprimento desse dever.
Palavras-Chaveconsumidor, direito a informação, relação de consumo.
Abstract
The research analyzes the importance of the duty of information in consumer relations. Through clear information and considering the consumer's informational and behavioral vulnerability, it is possible to guarantee understanding of the clauses and commitments established in the consumer relationship signed. The semantic clarity of the agreement eliminates informational asymmetry between the parties, avoiding the application of the protective regulations of the Consumer Protection Code in the event of non-compliance with this duty.
Keywordsconsumer, right to information, consumer relationship
INTRODUÇÃO
O presente trabalho busca analisar a importância do fornecimento da informação clara e eficaz para validade da relação de consumo estabelecida.
No primeiro momento esta pesquisa visa contextualizar o direito de informação no Código de Defesa do Consumidor, bem como pontuar a importância de uma informação clara e eficaz.
A partir da necessidade de observância das vulnerabilidades dos consumidores caso a caso, restou consagrada a expressão “clareza semântica” pelo Superior Tribunal de Justiça para determinar a necessidade da entrega da informação ao consumidor juntamente com a certeza de seu entendimento a respeito de seu conteúdo.
Por fim, esta pesquisa visou a demonstração de que o Código de Defesa de Consumidor trouxe proteção jurídica ao consumidor nos casos de ineficiência informacional.
O DEVER DE INFORMAR
O Código de Defesa do Consumidor[1] (CDC) trouxe o direito à informação como direito básico do consumidor e como princípio:
Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
(…)
IV – educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo;
(…)
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(…)
II – a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;
III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
O dever de informar é dever de conduta decorrente da boa-fé objetiva (dever anexo de informação) e sua simples inobservância caracteriza inadimplemento contratual.
TARTUCE[2] desenvolve o direito de informação da seguinte forma:
A informação, no âmbito jurídico, tem dupla face: o dever de informar e o direito de ser informado, sendo o primeiro relacionado com quem oferece o seu produto ou serviço ao mercado, e o segundo, com o consumidor vulnerável.
(…)
No contexto de valorização da transparência e da confiança nas relações negociais privadas, o Código de Defesa do Consumidor estabelece um regime próprio em relação aos meios de se propagar a informação, tendente a assegurar que a comunicação do fornecedor e a do produto ou serviço se façam de acordo com regras preestabelecidas, adequadas a ditames éticos e jurídicos que regulam a matéria
ALCÂNTARA[3] ao falar sobre o princípio da informação expõe:
A Política Nacional de Relações de Consumo garante e insere como princípio a educação e a informação – tanto a fornecedores quanto a consumidores – acerca de seus direitos e deveres, para que as relações possam ser melhoradas. A informação, sob a ótica do direito do consumidor, é dever do fornecedor e direito do consumidor.
Mas não é qualquer informação: é aquela capaz de fazer o consumidor entender, de maneira clara e transparente, tudo aquilo que está relacionado ao negócio que está fazendo ou que poderá fazer. Ela pode, primeiramente, advir da publicidade que o fornecedor faz para tentar atrair o cliente, para que este possa analisar com toda tranquilidade e optar por comprar ou não o produto ou serviço oferecido. A informação precisa quanto as características do produto ou do serviço e relativa ao preço, à quantidade e à qualidade está entre as obrigatoriedades de aplicação do princípio em tela.
Com efeito, o direito de informação é direito básico do consumidor e dever anexo do princípio da boa-fé objetiva.
Como apontado acima, não basta a simples entrega da informação sendo necessário que o consumidor entenda o seu conteúdo, o que o Superior Tribunal de Justiça chamou de “clareza semântica”.
DA CLAREZA SEMÂNTICA
O Ministro Luiz Felipe Salomão ao julgar o Resp nº 814.060-RJ STJ[4] estabeleceu que cláusulas limitativas em contratos de seguro devem apresentar não apenas “clareza física” (com destaque visual), mas também “clareza semântica”.
No REsp 1.837.434/SP[5], a ministra Nancy Andrighi também trouxe o entendimento:
“(…) O consumidor tem direito a informação plena do objeto do contrato, e não só uma clareza física das cláusulas limitativas, pelo simples destaque destas, mas, essencialmente, clareza semântica, com um significado homogêneo dessas cláusulas, as quais deverão estar ábdito a ambiguidade, a cláusula securitária que prevê cobertura apenas contra o furto qualificado, sem que tenha sido esclarecido o seu alcance e significado ao consumidor, diferenciando-o do furto simples, pode ser considerada abusiva pela falha do dever geral de informação da seguradora. (…)”
Note-se que diante da presumida vulnerabilidade do consumidor é preciso que a informação seja prestada com a observância das vulnerabilidades do público-alvo caso a caso.
A obrigação de prestar informação não pode ser homogênea a todos os consumidores, pois é preciso considerar as diferenças de entendimento do receptor já que se não compreendidas adequadamente poderá impedir o consumidor de exercer seu direito de forma livre e informada.
ALCÂNTARA[6] descreve o princípio consumerista de vulnerabilidade:
O princípio reconhece a vulnerabilidade do consumidor na relação de consumo, por ser a parte mais frágil dessa relação em vários aspectos, se não em todos, que o envolvem com o fornecedor. A expressão vulnerabilidade deve ser vista em sentido amplo, pois o consumidor não sabe como o produto é produzido ou como o serviço será prestado, não detém nem conhece os instrumentos jurídicos condizentes com a relação com o fornecedor e, normalmente, tem uma condição financeira muito aquém da condição do fornecedor.
Portanto, o conceito de vulnerabilidade é genérico, pois inclui o desequilíbrio técnico, jurídico e econômico, principalmente em relação ao consumidor pessoa física.
Neste contexto, é preciso considerar a vulnerabilidade informacional do consumidor não sendo suficiente o simples fornecimento da informação.
Há, na verdade, uma assimetria de conhecimento que deve ser ponderada e sopesada a fim de garantir a proteção do consumidor.
Note-se que a informação não pode, por exemplo, para ser considerada válida e eficaz, ser prestada da mesma forma ao consumidor alfabetizado e ao não alfabetizado
Da mesma forma, é preciso observar a vulnerabilidade comportamental do consumidor que consiste na capacidade limitada em processar informações complexas no ato de consumo (influências externas).
A informação clara reduz as vulnerabilidades possibilitando o consumidor fazer uma análise de custos e benefícios. Ademais, o excesso de informação nem sempre é o caminho mais produtivo se o consumidor não for capaz de processá-las adequadamente.
CONSEQUÊNCIAS DECORRENTES DO DESCUMPRIMENTO DO DIREITO DE INFORMAÇÃO
Por meio dos artigos 30, 31, 46, 47 e 48 do CDC, este diploma construiu uma estratégia de incentivo à produção de informação útil a formação de vontade do consumidor.
É condição para a exigibilidade das obrigações contratuais, que o consumidor saiba, prévia e adequadamente, de todos os aspectos do seu contrato de consumo.
Os artigos 30 do CDC traz como informação vinculante a que for “suficientemente precisa”, bem como o art.31 ressalta que toda informação no contrato de consumo tem que ser suficientemente precisa.
Observa-se que ao fornecer uma informação deficiente ocorre um vício na vontade do consumidor que o desobriga ao cumprimento do contrato, nos termos do art.46 do CDC.
Na hipótese de interpretações dúbias, nos termos do art.47 do CDC, a interpretação ocorrerá de forma mais favorável ao consumidor.
O art.48 reconhece a informalidade do contrato de consumo havendo uma proteção a motivação em detrimento de qualquer forma.
CONCLUSÃO
O dever de informação é um dever anexo da boa-fé objetiva e um direito básico do consumidor nas relações de consumo.
Diante da vulnerabilidade presumida do consumidor e da assimetria informacional das partes é preciso garantir no contrato de consumo uma clareza semântica sobre as informações fornecidas ao consumidor.
A comunicação deve ser adaptada às necessidades específicas de cada grupo de consumidores, garantindo que todos tenham acesso a informações claras e compreensíveis, conforme preconiza o CDC.
Na ocorrência do descumprimento desse dever, o próprio Código de Defesa do Consumidor trouxe proteção jurídica para enfrentar a situação.
BIBLIOGRAFIA
ALCÂNTARA. Silvano Alves. Direito Empresarial e Direito do Consumidor. Editora Intersaberes. 2017.
BRASIL. Lei n° 8078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm. Acesso em 03.agosto.2025
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 814.060/RJ, Relator: Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 6 abr. 2010, publicado em 13 abr. 2010. Disponível em: https://www.stj.jus.br. Acesso em: 03 de agosto de 2025.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.837.434/SP, Relatora: Ministra Nancy Andrighi, julgado em 3 dez. 2019, publicado em 5 dez. 2019. Disponível em: https://www.stj.jus.br. Acesso em: 03 de agosto de 2025.
TARTUCE, Flávio. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual do Direito do Consumidor. Direito Material e Processual. Editora Método. 6ªedição. 2017
[1] BRASIL. Lei n° 8078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm. Acesso em 03.agosto.2025
[2] TARTUCE, Flávio. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual do Direito do Consumidor. Direito Material e Processual. Editora Método. 6ªedição. 2017. P.37,38 e 40
[3] ALCÂNTARA. Silvano Alves. Direito Empresarial e Direito do Consumidor. Editora Intersaberes. 2017. p.125
[4] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 814.060/RJ, Relator: Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 6 abr. 2010, publicado em 13 abr. 2010. Disponível em: https://www.stj.jus.br. Acesso em: 03 de agosto de 2025.
[5] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.837.434/SP, Relatora: Ministra Nancy Andrighi, julgado em 3 dez. 2019, publicado em 5 dez. 2019. Disponível em: https://www.stj.jus.br. Acesso em: 03 de agosto de 2025.
[6] ALCÂNTARA. Silvano Alves. Direito Empresarial e Direito do Consumidor. Editora Intersaberes. 2017. p.123
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)
Sousa, Camila Martins de. O direito a informação nas relações de consumo. Revista Di Fatto, Ciências Humanas, Direito, ISSN 2966-4527, DOI 10.5281/zenodo.16755095, Joinville-SC, ano 2025, n. 5, aprovado e publicado em 06/08/2025. Disponível em: https://revistadifatto.com.br/artigos/o-direito-a-informacao-nas-relacoes-de-consumo/. Acesso em: 17/09/2025.