O Diálogo das Fontes entre o Direito Civil e o Direito do Consumidor: Prazos Prescricionais e a Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça

Categoria: Ciências Humanas Subcategoria: Direito

Este artigo foi revisado e aprovado pela equipe editorial.

Revisor: C.E.R. em 2025-03-14 15:07:29

02/03/2025

Autores

Foto do Autor
Maria Orsi Cembranelli

Curriculo do autor: Advogada. Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP). Especialista em Criminologia pelo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) em parceria com a Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados de São Paulo (ESA OAB-SP).

Insira o texto exatamente como deseja que apareça na sua declaração. Se for aprovado pela revista, sua declaração sairá conforme pré-visualização abaixo

Resumo

O artigo analisa a interação entre o Código Civil (CC) e o Código de Defesa do Consumidor (CDC) pelo diálogo das fontes. Destaca-se que, apesar das diferenças principiológicas, o CC incorporou aspectos sociais que o aproximam do CDC. A teoria, defendida por Cláudia Lima Marques, propõe a aplicação da norma mais favorável ao consumidor. O estudo examina decisões do STJ sobre prazos prescricionais, demonstrando um equilíbrio entre os códigos. Conclui-se que o tribunal adota o diálogo das fontes, mas nem sempre prioriza a norma mais benéfica ao consumidor, privilegiando, em alguns casos, a especialidade do CDC.

Palavras-Chave

Diálogo das fontes, Código de Defesa do Consumidor, STJ.

Abstract

The article analyzes the interaction between the Civil Code (CC) and the Consumer Defense Code (CDC) through the dialogue of sources. It highlights that, despite their principled differences, the CC has incorporated social aspects that bring it closer to the CDC. The theory, advocated by Cláudia Lima Marques, proposes applying the most favorable rule to the consumer. The study examines STJ rulings on prescription periods, demonstrating a balance between the codes. It concludes that the court adopts the dialogue of sources but does not always prioritize the most beneficial rule for the consumer, sometimes favoring the CDC’s specificity.

Keywords

Dialogue of sources, Consumer Defense Code, STJ.

1.     INTRODUÇÃO

O presente artigo examina a interação entre o Código Civil (CC) e o Código de Defesa do Consumidor (CDC) a partir da perspectiva do diálogo das fontes. Inicialmente, são analisadas as diferenças nos princípios que regem cada um desses diplomas normativos, bem como algumas mudanças introduzidas na legislação civilista com o advento do Código Civil de 2002.

Em seguida, o estudo aborda os principais conceitos relacionados ao diálogo das fontes, a partir da contribuição da jurista Cláudia Lima Marques, destacando sua relevância para a aplicação simultânea e harmônica das normas jurídicas.

Por fim, o artigo se dedica à análise da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, com foco nos prazos prescricionais. Embora outros recortes fossem possíveis, essa escolha permite ilustrar como a Corte tem conciliado diferentes normativos na fixação dos prazos aplicáveis às demandas.

2.     ANÁLISE COMPARATIVA: LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA E CIVILISTA

O Direito do Consumidor no Brasil é regulamentado, principalmente, pela Lei nº 8.078, de 1990, que instituiu o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Entre as previsões estruturantes do Código, destaca-se o princípio da vulnerabilidade do consumidor, previsto no art. 4º, I, do CDC, que reconhece que o consumidor está em posição de desvantagem em relação ao fornecedor no mercado de consumo.

Tal vulnerabilidade pode ser classificada em diferentes categorias. A vulnerabilidade econômica ou fática refere-se à desvantagem do consumidor em razão de sua fragilidade financeira frente ao poder econômico dos fornecedores.

Por sua vez, a jurídica está relacionada à desigualdade no conhecimento sobre direitos e deveres nas relações de consumo. Já a técnica diz respeito à falta de conhecimento especializado do consumidor sobre o produto ou serviço que adquire.

Por fim, a informacional lembra que, na maior parte dos casos, os consumidores não têm acesso ou não compreendem todas as informações essenciais para uma decisão plenamente consciente[1].

Cumpre mencionar que, diferente da hipossuficiência, que exige prova concreta da desvantagem do consumidor em determinado caso, a vulnerabilidade é presumida, ou seja, sempre considerada presente na relação de consumo. Tal princípio justifica a criação de normas que equilibram a relação contratual, garantindo ao consumidor tratamento diferenciado para compensar sua fragilidade.

O CDC estabelece medidas como a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII), que facilita sua defesa em juízo, a vedação de cláusulas abusivas (art. 51), que protege contra condições desproporcionais, e o direito à informação clara e adequada (art. 6º, III), garantindo transparência nas relações de consumo.

O Direito Civil, ao contrário do Direito do Consumidor, parte da premissa de que as partes estão em posição de igualdade. Busca-se regular relações privadas com base nos princípios da liberdade contratual, que permite às partes definir os termos do contrato conforme sua vontade, e da força obrigatória dos contratos, que estabelece que as obrigações acordadas devem ser cumpridas.

Além disso, o Direito Civil, em sua abordagem tradicional, tende a limitar demasiadamente as intervenções nas relações privadas, permitindo que as partes se auto legislem de acordo com seus interesses.

Ainda que assim seja, a legislação civilista sofreu transformações significativas com o advento do Código Civil de 2002[2]. De acordo com Miguel Reale, coordenador da comissão responsável por sua elaboração, o código atual representa uma verdadeira “constituição do homem comum” e se configura como a “lei por excelência da sociedade civil”[3].

Quanto ao caráter do Código Civil atual, leciona Gonçalves:

 “O Código Civil de 2002 procurou afastar-se das concepções individualistas que nortearam o diploma anterior para seguir orientação compatível com a socialização do direito contemporâneo. O princípio da sociabilidade por ele adotado reflete a prevalência dos valores coletivos sobre os individuais, sem perda, porém, do valor fundamental da pessoa humana. Com efeito, o sentido social é uma das características mais marcantes do novo diploma, em contraste com o sentido individualista que condiciona o Código Beviláqua[4]

Nesse sentido, pode-se afirmar que o Código Civil de 2002 reflete mudanças no direito privado, alinhando-se a princípios que se aproximam da perspectiva consumerista, como a função social do contrato e as possibilidades de sua revisão em determinadas situações.

Contudo, a diferença persiste: enquanto o Direito Civil regula relações privadas de maneira mais ampla, pressupondo que as partes estejam em condições de igualdade, o Direito do Consumidor busca estabelecer regras protetivas com o intuito de equilibras relações entre partes presumidamente desiguais.

3.     O DIÁLOGO ENTRE O CÓDIGO CIVIL E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR: EXPLORANDO AS CONEXÕES

A Teoria do Diálogo das Fontes, proposta pelo jurista alemão Erik Jayme, buscou a interação entre as diretrizes da comunidade europeia e as legislações nacionais. O jurista sustentou que, no direito pós-moderno, a ideia de resolver conflitos de normas por meio da revogação ou pela imposição de uma única norma deve ser substituída pela coexistência e diálogo entre essas normas. Esse diálogo permite que as fontes jurídicas, em vez de se excluir, se complementem de maneira coordenada, respeitando as complexidades da sociedade atual[5].

Entre as principais responsáveis pela “adaptação” e desenvolvimento da teoria ao solo brasileiro, está a jurista Claudia Lima Marques, autora de parte considerável dos artigos em português escritos sobre o tema. Em razão das suas e das contribuições de outros autores, hoje a teoria é aplicada no direito consumidor pátrio, e também em áreas como direito de família, falências, processo civil, tributário e até no direito penal.

Analisando especificamente a relação entre o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e do Código Civil de 2002 (CC/2002), a jurista propõe que a aplicação simultânea, coordenada e sistemática dos dois códigos seja vista como um “diálogo das fontes”. Marques ainda explica que, nesse diálogo, deve-se adotar sempre “a solução mais favorável aos mais fracos da relação (tratamento diferente dos diferentes)[6].”

A autora também afirma, ao contrário do que se poderia pensar, que não há um conflito real entre os dois códigos, mas sim antinomias aparentes, que podem ser resolvidas por meio de uma aplicação ordenada e subsidiária das leis.

Segundo a jurista, esse diálogo se manifesta de três formas principais: o diálogo de coerência, o diálogo de complementariedade e subsidiariedade em casos de antinomias (reais ou aparentes), e o diálogo de coordenação e adaptação sistemática[7].

A primeira forma de diálogo entre o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e o Código Civil de 2002 (CC/2002) é denominada “diálogo sistemático de coerência”. Esse tipo de interação ocorre quando, ao se aplicar as duas leis simultaneamente, uma delas fornece uma base conceitual para a outra[8].

Um exemplo claro dessa aplicação pode ser observado nas relações de compra e venda. Nesse contexto, o Código Civil define as regras gerais para a transação (como o contrato de compra e venda), enquanto o CDC entra para garantir os direitos do consumidor, como a proteção contra cláusulas abusivas ou a obrigação de fornecer informações claras.

Ou seja, o Código Civil estabelece a estrutura da relação, enquanto o CDC aplica-se para proteger os interesses da parte mais vulnerável, que é o consumidor, assegurando assim uma coerência entre as normas.

A segunda forma de diálogo é denominada “diálogo de influências recíprocas sistemáticas”, que ocorre quando os conceitos de uma lei influenciam ou moldam os conceitos de outra. A ideia é que tanto as normas gerais quanto as especiais se influenciam mutuamente.

 Claudia Lima Marques usa o termo “diálogo de doublé sens” para descrever essa relação bidirecional. Isso pode ser observado quando da análise do conceito de consumidor, que, embora seja definido principalmente pelo CDC, pode sofrer influências do Código Civil, especialmente no que diz respeito a disposições que envolvem obrigações e responsabilidade civil[9].

O terceiro diálogo é chamado “diálogo de complementaridade ou subsidiariedade”. Aqui, as duas leis se aplicam de forma coordenada, com uma norma complementando a outra. O “diálogo de complementaridade” ocorre quando uma norma preenche lacunas da outra de maneira direta, enquanto o “diálogo de subsidiariedade” se dá quando uma norma entra em cena apenas quando a outra não for suficiente para resolver a questão[10].

Um exemplo desse diálogo está nos contratos de adesão, que são simultaneamente contratos de consumo. Nesse caso, além das disposições gerais do Código Civil, que protegem contra cláusulas abusivas em contratos de adesão (artigos 423 e 424), aplica-se também a proteção prevista no CDC. As duas legislações se aplicam de forma coordenada, com o Código Civil regulando as bases do contrato e o CDC protegendo o consumidor da abusividade e da falta de transparência.

Tratando de outras regras previstas nos dois diplomas analisados, pouco após a promulgação do Código Civil, Marques projetou cenário otimista com relação a aplicação do diálogo das fontes entre este e o Código de Defesa do Consumidor. Nas palavras da autora:

 “Funcionalmente, ou pela teleologia do próprio Código de Defesa do Consumidor e da Constituição Federal há que se utilizar a norma mais favorável aos direitos do consumidor. Sendo assim, parece-me que o Novo Código Civil de 2002 trará também novos direitos aos consumidores. Também suas cláusulas gerais, de responsabilidade sem culpa pela atividade de risco (art. 927, parágrafo único, CC/2002), responsabilidade sem culpa das empresas e empresários individuais pelo fato do produto (art. 931, CC/2002), de redução da prestação ou alteração da forma de execução do contrato de mútuo por onerosidade excessiva (art. 480, CC/2002), de redução da cláusula penal (art. 413, CC/2002) poderão complementar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ou mesmo superá-la se forem mais favoráveis aos consumidores (imagino, por exemplo, o caso de prescrição da ação ou de excludente específica do Código de Defesa do Consumidor, que não esteja presente no sistema geral do Novo Código Civil de 2002 e uso, pois do Novo Código Civil de 2002 como lei mais favorável). Assim, neste diálogo de complementaridade e subsidiariedade em antinomias aparentes ou reais entre o Código de Defesa do Consumidor e o Novo Código Civil de 2002, as cláusulas gerais do Novo Código Civil de 2002 podem encontrar uso subsidiário ou complementar em caso regulado pelo Código de Defesa do Consumidor, se mais favoráveis ao consumidor. O juiz, no caso concreto, irá, pois, concretizar o favor debilis expressamente permitido no art. 7.º do CDC, que menciona inclusive a equidade, sua ratio maior”[11].

Como demonstrado na transcrição acima, Cláudia Lima Marques propõe que, em casos de antinomias entre os dois códigos, deve prevalecer a norma que mais favoreça o consumidor, o que, segundo a autora, inclui também as questões relativas aos prazos prescricionais.

Dessa forma, surge a necessidade de examinar, mais de 20 anos após a promulgação do Código Civil de 2002, se tais previsões se concretizaram na prática judicial.

Assim, no próximo capítulo, serão analisadas decisões do Superior Tribunal de Justiça para verificar como o diálogo das fontes tem sido aplicado em relação à prescrição, à luz do entendimento antecipado por Marques, com o objetivo de avaliar se a Corte Superior tem, de fato, adotado a norma mais benéfica para o consumidor nos casos concretos.

4.     O DIÁLOGO DAS FONTES NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SOBRE PRAZOS PRESCRICIONAIS

O conceito de diálogo das fontes tem sido frequentemente destacado nas decisões do Superior Tribunal de Justiça. Neste tópico, como já antecipado, serão analisadas jurisprudências do STJ relacionadas à aplicação de prazos prescricionais, com o objetivo de investigar como o Tribunal tem manejado a interação entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil.

Busca-se, desta maneira, avaliar se, nos casos analisados, o diálogo das fontes tem sido utilizado para garantir a proteção do consumidor, especialmente quando as normas do Código Civil se mostram mais favoráveis do que as previstas no CDC. Em outras palavras, será verificado se, no entendimento do STJ, a norma considerada mais especial (CDC), quando menos benéfica do que a norma mais ampla (CC), tem cedido espaço à aplicação desta última.

O primeiro caso que convém trazer diz respeito a uma ação indenizatória relacionada ao tabagismo, na qual se discutia a responsabilidade civil da indústria do cigarro, julgado em 2010. O voto da nobre relatora, Ministra Nancy Andrighi, foi no sentido da prevalência do prazo prescricional de vinte anos previsto no Código Civil de 1916 sobre o Código de Defesa do Consumidor, por ser mais benéfico ao consumidor[12].

Colaciona-se trecho do brilhante voto:

(…) “não é o CDC que limita o Código Civil, é o Código Civil que dá base e complementa o CDC, de modo que se aquele for mais favorável ao consumidor do que este, não será a lei especial que limitará a aplicação da lei geral; estas dialogarão à procura da realização do mandamento constitucional de fazer prevalecer a proteção da parte hipossuficiente da relação de consumo.

No particular, o prazo mais favorável ao consumidor é aquele do art. 177 do CC/16, que fixa um prazo prescricional de 20 anos, devendo, por esse motivo, prevalecer sobre o prazo de 05 anos previsto no art. 27 do CDC.(…)

Cumpre mencionar ainda que, na ocasião, o excelentíssimo Ministro Paulo Furtado acompanhou o voto da relatora. Entretanto, após os votos divergentes dos três outros Ministros que integraram o julgamento, quais sejam os senhores Massami Uyeda, Sidnei Beneti e Luis Felipe Salomão, decidiu-se pela aplicação da previsão do CDC, e os ministros que estavam em minoria retificaram seus votos.

Assim, prevaleceu o entendimento de que o Código Civil tem caráter geral que vai de encontro ao regido na legislação consumerista. Deste modo, com fulcro na proteção da segurança jurídica e no princípio da especialidade, a ação foi julgada prescrita, haja vista o transcurso do prazo de cinco anos previsto no CDC.

Dando continuidade à análise, o segundo caso relevante refere-se às ações de repetição de indébito envolvendo tarifas de serviços de água e esgoto cobradas indevidamente, e deu origem a sumula 412, do STJ.

O debate central girava em torno do prazo prescricional a ser aplicado nessas situações. A Companhia de Saneamento Básico de São Paulo (Sabesp) defendia a aplicação do prazo de três anos para o ressarcimento, conforme estabelecido no artigo 206, parágrafo 3º, do Código Civil de 2002.

Entretanto, ao julgar o recurso repetitivo tema 932, o STJ consolidou a tese de que o prazo prescricional para essas ações é de 10 anos, quando regidas pelo Código Civil de 2002, ou de 20 anos, caso se aplique o Código Civil de 1916. Note-se que, no caso, não existia prazo específico nem no Código de Defesa do Consumidor, nem no Código Civil.

Destarte, a Corte considerou que, diante da ausência de uma previsão específica para esse tipo de ação, o prazo de três anos defendido pela Sabesp não se aplicava, devendo prevalecer a regra geral do artigo 205 do CC. Nos termos da súmula:

SÚMULA 412: A ação de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto sujeita-se ao prazo prescricional estabelecido no Código Civil.

 O terceiro caso, igualmente relevante, deu origem a outra súmula:

SÚMULA 477: A decadência do art. 26 do CDC não é aplicável à prestação de contas para obter esclarecimentos sobre cobrança de taxas, tarifas e encargos bancários.

Nesse caso, o STJ decidiu que o prazo de 90 dias previsto no art. 26 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) não se aplica à ação de prestação de contas contra bancos para esclarecer cobranças de taxas, tarifas e encargos. A razão é que tal ação não se refere a vícios ou defeitos no serviço prestado, mas sim ao esclarecimento de lançamentos na conta bancária. Portanto, o art. 26 do CDC, que trata de prazos para vícios em produtos ou serviços, não se aplica.

Sendo assim, o STJ consolidou a posição de que o prazo para ajuizar ações de prestação de contas é prescricional. E, na ausência de uma previsão específica para a prescrição, deve-se aplicar o prazo de 10 anos, conforme o art. 205 do Código Civil e a Súmula 83 do STJ.

A análise conjunta desses três casos – tanto o relacionado ao consumo de tabaco quanto aqueles que originaram as duas súmulas – ilustra como, dependendo das especificidades de cada ação, os critérios adotados pela Corte Superior variam. Assim, no subtópico final, abordaremos os padrões e as diferenças identificadas nos precedentes.

4.1.  Reflexões Finais

Cláudia Lima Marques apresentou uma perspectiva ampla sobre a aplicação do diálogo das fontes aos prazos prescricionais, sustentando que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) não deveria restringir a aplicação do Código Civil (CC), mas sim permitir o uso da norma mais favorável ao consumidor, ainda que esta estivesse na legislação geral. A ideia central é que o CDC, enquanto sistema aberto e permeável, poderia dialogar com o CC e demais normas para garantir maior proteção para a parte vulnerável.

Contudo, ao analisar a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, observa-se que a Corte tem adotado um critério pragmático: na ausência de previsão específica no CDC, recorre-se ao Código Civil e, se também não houver previsão expressa neste, aplica-se o prazo prescricional geral de 10 anos, conforme o artigo 205 do CC.

Assim, ao menos nos casos analisados, não se verificou a aplicação plena da lógica proposta por Marques, especialmente no sentido de que o CDC não deveria impor limitações ao CC. Ao contrário, a jurisprudência indica que, na prática, a estrutura do CDC não tem sido interpretada como uma norma aberta a ser complementada pela legislação geral para beneficiar a parte hipossuficiente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em: <Constituição> Acesso em: 25 fev. 2025.

BRASIL. Código Civil. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: <L10406compilada> Acesso em: 25 fev. 2025.

BRASIL. Código de Defesa do Consumidor. Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 12 set. 1990. Disponível em: <L8078compilado>. Acesso em: 25 fev. 2025.

GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil, volume I: parte geral. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, v. 3. São Paulo: Saraiva, 2006.

MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 5. ed. rev. , atual. e ampl., incluindo mais de 1.000 decisões jurisprudenciais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.

MARQUES, Claudia Lima. Superação das antinomias pelo diálogo das fontes: o modelo brasileiro de coexistência entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002. Revista da ESMESE, n. 07, 2004. Disponível em: https://revistaejuse.tjse.jus.br/revistaejuse/index.php/revista_da_ejuse/article/view/147/153. Acesso em: 25 fev. 2025.

MARQUES, Claudia Lima. Diálogo entre o Código de Defesa do Consumidor e o Novo Código Civil – do “diálogo das fontes” no combate às cláusulas abusivas. Revista de Direito do Consumidor, vol. 45, 2003, p. 71-99.

MARQUES, Claudia Lima. Diálogo das fontes: fundamentos, experiência jurisprudencial e crítica metodológica. Dissertação (Mestrado) – Universidade de São Paulo, 2019. Acesso em: 25 fev. 2025.

MARTINS-COSTA, Judith; BRANCO, Gerson. Diretrizes teóricas do novo Código Civil brasileiro.

REALE, Miguel. Visão geral do novo Código Civil. Informativo Tribunal de Justiça e Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, v. no/dez. 2002, n. 6, p. 13, 2002. Tradução. Acesso em: 25 fev. 2025.

REALE, Miguel (Conf.). Lacunas e arcaísmos do código civil vigente, in O Projeto do Novo Código Civil. 2.ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999.

SOUZA, Fernando Speck de. Diálogo das fontes: fundamentos, experiência jurisprudencial e crítica metodológica. Dissertação (Mestrado) – Universidade de São Paulo, 2019. Acesso em: 25 fev. 2025.


[1] MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 5. ed. rev. , atual. E ampl., incluindo mais de 1.000 decisões jurisprudenciais – São Paulo: Editora Revista Dos Tribunais, 2005. p. 321-325.

[2] REALE, Miguel. Visão geral do novo código civil. Informativo Tribunal de Justiça e Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. v. no/dez. 2002, n. 6, 2002, Tradução. Acesso em 25 fev. 2025.

[3] REALE, Miguel. Projeto de código civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.

[4] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, v.3, p. 4. São Paulo: Saraiva, 2006.

[5] SOUZA, Fernando Speck de. Diálogo das fontes: fundamentos, experiência jurisprudencial e crítica metodológica. Dissertação (Mestrado) – Universidade de São Paulo, 2019. Acesso em: 25 fev. 2025.

[6] MARQUES, Claudia Lima. Diálogo entre o Código de Defesa do Consumidor e o Novo Código Civil – do “diálogo das fontes” no combate às cláusulas abusivas. Revista de Direito do Consumidor | vol. 45/2003 | p. 71 – 99 | Jan – Mar / 2003 Doutrinas Essenciais de Direito do Consumidor | vol. 1 | p. 643 – 678 | Abr / 2011 Doutrinas Essenciais de Responsabilidade Civil | vol. 4 | p. 57 – 90 | Out / 2011 DTR\2003\811. Disponível em: get___1545137988043-libre.pdf. Acesso em: 25 fev. 2025.

[7] MARQUES, Claudia Lima. Superação das antinomias pelo diálogo das fontes: o modelo brasileiro de coexistência entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002. Revista da ESMESE, n. 07, 2004. Disponível em: https://revistaejuse.tjse.jus.br/revistaejuse/index.php/revista_da_ejuse/article/view/147/153. Acesso em: 25 fev. 2025.

[8] Ibidem.

[9] Ibidem.

[10] Ibidem.

[11] MARQUES, Claudia Lima. Diálogo entre o Código de Defesa do Consumidor e o Novo Código Civil – do “diálogo das fontes” no combate às cláusulas abusivas. Revista de Direito do Consumidor | vol. 45/2003 | p. 71 – 99 | Jan – Mar / 2003 Doutrinas Essenciais de Direito do Consumidor | vol. 1 | p. 643 – 678 | Abr / 2011 Doutrinas Essenciais de Responsabilidade Civil | vol. 4 | p. 57 – 90 | Out / 2011 DTR\2003\811. Disponível em: get___1545137988043-libre.pdf. Acesso em: 25 fev. 2025.

[12] STJ – REsp 1009591/RS, Rela. Mina. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 23.08.2010.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CEMBRANELLI, Maria Orsi. O Diálogo das Fontes entre o Direito Civil e o Direito do Consumidor: Prazos Prescricionais e a Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Revista Di Fatto, Subcategoria Ciências Humanas, Direito, ISSN 2966-4527, DOI 10.5281/zenodo.15027092, Joinville-SC, ano 2025, n. 4, aprovado e publicado em 14/03/2025. Disponível em: https://revistadifatto.com.br/artigos/o-dialogo-das-fontes-entre-o-direito-civil-e-o-direito-do-consumidor-prazos-prescricionais-e-a-jurisprudencia-do-superior-tribunal-de-justica-2/. Acesso em: 24/04/2025.