Exigência de programas de integridade nas contratações públicas
Autores
Resumo
Este trabalho analisa a Lei Anticorrupção brasileira (Lei 12.846/2013), que introduziu a responsabilidade administrativa e civil das entidades empresariais por atos de corrupção ou conduta ilícita contra a administração pública. Em complemento, o Decreto 8.420 de 2015 estabeleceu diretrizes de compliance, destacando os programas de integridade como uma medida proativa para prevenir práticas corruptas. Embora a implementação desses programas não seja obrigatória, sua adoção é cada vez mais essencial para empresas que contratam com o setor público, com alguns estados promulgando leis que exigem esses programas. O estudo explora o cenário regulatório, as implicações constitucionais e os benefícios da implementação de programas de integridade para empresas e parcerias no setor público.
Palavras-ChaveCompliance Anticorrupção. Programas de Integridade Corporativa. Accountability no Setor Público
Abstract
This paper analyzes Brazil's Anti-Corruption Law (Law 12.846/2013), which introduced civil and administrative accountability for corporate entities involved in corruption or misconduct against the public administration. Following this, the 2015 Decree 8.420 established compliance guidelines, emphasizing integrity programs as a proactive measure to prevent corrupt practices. These integrity programs, though not mandatory, are increasingly recognized as essential for companies contracting with the public sector, with some states enacting laws that require such programs. This study explores the regulatory landscape, the constitutional implications, and the benefits of implementing integrity programs for businesses and public sector partnerships.
KeywordsAnti-Corruption Compliance. Corporate Integrity Programs.Public Sector Accountability
1. INTRODUÇÃO
Com o advento da Lei nº 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção ou Lei da Empresa Limpa, que fixou no Brasil a responsabilização objetiva administrativa e civil das pessoas jurídicas pela prática de atos lesivos que sejam cometidos em seu interesse ou benefício, contra a administração pública, nacional ou estrangeira, cresceu o interesse dos envolvidos da realização de investigação prévia das empresas e de seu histórico, visando primeiramente minimizar os riscos e impactos nos valores das ações, da imagem e fomentando a obrigatoriedade de cumprimento pelos entes envolvidas de regras de conduta e ética.
Após a sua implementação da legislação supra, foi publicado o Decreto nº 8420 de 2015, que em seu artigo 41, estabeleceu o conceito da criação de programa de integridade, dentro da política de compliance, dispondo como sendo o conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade e auditoria com vistas a incentivar à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva dos códigos de ética e conduta de atos praticados contra a administração pública.
Dessa forma, orientou-se as empresas a criação de programa de integridade dentro de uma toda estrutura criada para fins de se evitar a responsabilização objetiva das Empresas envolvidas, tendo como foco a criação de medidas anticorrupção que visem prevenção, mitigação para que não haja a incidência das penalidades descritas na Lei nº 12.846/2013.
Entende-se assim o programa de integridade como sendo um segmento do compliance específico para prevenir e remediar, possíveis irregularidades e sanções administrativas, visando a coibição de práticas de corrupção e o fiel cumprimento ao código de ética e conduta das empresas, porém sua exigência apesar de recomendação não é obrigatória, visto que a legislação não trouxe tal condição para a contratação perante a administração pública.
2. EXIGÊNCIA DE PROGRAMAS DE INTEGRIDADE NAS CONTRATAÇÕES PÚBLICAS
Para mitigar o risco de estarem sujeitos as penalidades impostas pela Lei nº 12.846/2013 e principalmente após a publicação do Decreto nº 8.420/2015 que passou a regulamentar conceitos trazidos pela legislação de 2013, os entes diretamente ligados a transações perante os órgãos públicos, passaram a buscar mecanismos para a implementação e a criação de um programa de compliance, dentre os quais faz parte a inserção de um programa de integridade, a fim de se adequar as exigências dos entes públicos.
O programa de integridade pública pode ser entendido como um conjunto de procedimentos internos de auditoria e um alinhamento consistente para a efetividade dos códigos de ética e conduta, a fim de aderência aos valores, princípios e normas éticos compartilhados pela organização envolvida com a administração pública.
O artigo 41 do Decreto nº 8.420 de 2015[1] descreve como sendo o programa de integridade o que segue:
“Para fins do disposto neste Decreto, programa de integridade consiste, no âmbito de uma pessoa jurídica, no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes com objetivo de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira.
Parágrafo Único. O programa de integridade deve ser estruturado, aplicado e atualizado de acordo com as características e riscos atuais das atividades de cada pessoa jurídica, a qual por sua vez deve garantir o constante aprimoramento e adaptação do referido programa, visando garantir sua efetividade”.
Imperiosa assim para sua concretização, que seja realizada a análise de perfil de riscos da Empresa após o processo de coletas de como funciona seus processos internos e externos, sua estrutura organizacional, área de atuação e principais parceiros de negócio, e bem como seu nível de interação com a administração pública– nacional ou estrangeiro – e consequentemente avaliar os riscos para o cometimento dos atos lesivos da Lei nº 12.846/2013.
Deverá ser criado toda uma estruturação das regras e instrumentos com base no conhecimento do perfil e riscos da empresa ao elaborar o programa de integridade, desenvolvendo formas para avaliar e detectar o problema, e assim definir punições ou medidas disciplinares em caso de respeito e medidas de remediação.
Após a criação do mecanismo é necessário uma ampla e efetiva divulgação do Programa de Integridade, com a criação de estratégias de comunicação e treinamento e disseminação da sua criação e efetividade aos demais envolvidos, com a elaboração de monitoramento e visão contínua do processo, trabalhando o responsável em criar mecanismos para que as deficiências encontradas em qualquer área possam ser continuamente e de acordo com a realidade vivenciada pela Empresa, ser readequada ou mesmo corrigida.
Passadas tais considerações que embasam de forma geral como deverá ser implementado o programa de integridade, alguns Estados passaram a editar leis exigindo a criação de um programa de integridade como requisito para contratar perante a administração pública, o que vem gerando certo desconforto e debates nos mais diversos campos, visto que a legislação trazida no decreto n. 8420/2015 não prevê a obrigatoriedade de sua criação, se tratando apenas de diretrizes para auxiliar as empresas e entes a construir e aperfeiçoar mecanismos destinados à não incidência as sanções administrativas previstas na Lei nº 12.486/2013, destinada a coibir práticas de corrupção e desvio de finalidade.
No que diz respeito as licitações e contratações pelo poder público, existem algumas que sugerem como forma e critério de pontuação, a implantação e funcionamento do programa sob os tipos de melhor técnica e técnica e preço, conforme prevê a Nova Lei de Licitações.
O Decreto nº 8420/2015 trouxe alguns fundamentos que devem ser observados pelos envolvidos e reacendeu a necessidade de uma investigatória satisfatória e mediante o engajamento da alta gestão Confira-se[2]:
Art. 42. Para fins do disposto no § 4º do art. 5º, o programa de integridade será avaliado, quanto a sua existência e aplicação, de acordo com os seguintes parâmetros:
I – comprometimento da alta direção da pessoa jurídica, incluídos os conselhos, evidenciado pelo apoio visível e inequívoco ao programa;
II – padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos de integridade, aplicáveis a todos os empregados e administradores, independentemente de cargo ou função exercidos;
III – padrões de conduta, código de ética e políticas de integridade estendidas, quando necessário, a terceiros, tais como, fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados;
IV – treinamentos periódicos sobre o programa de integridade;
V – análise periódica de riscos para realizar adaptações necessárias ao programa de integridade
É de suma importância que a própria administração pública mostre o interesse para evitar ações de corrupção, visto que interferem diretamente na economia e geram impactos imensuráveis.
Os princípios da moralidade administrativa e da impessoalidade, ambos trazidos no caput do artigo 37 da Constituição de 1988, infere a necessidade de criação de um programa de integridade, posto que a sua implementação visa a aplicação dos códigos de conduta e ética e de políticas de relacionamento entre os setores privado e público, um e outros contidos que vem ser contidos no programa de integridade.
A publicidade também é imperiosa quando as empresas implementem o programa, posto que dará mais efetividade a tal conceito ao conceder o acesso a informações visando ainda salvaguardar à transparência.
O Princípio da eficácia por sua vez, se materializa quando a Empresa possui programa de integridade, visto que dentre os manuais de procedimentos desenvolvido constará ferramentas de controle interno e constante auditórias.
Nessa linha de entendimento, Zaganelli e Miranda[3] dilucidam que embora não seja a única alternativa e seja preciso ainda maiores empenhos, o compliance público contribui, positivamente, para a efetividade das medidas de acesso às informações para o exercício do controle social no combate à malversação dos recursos públicos, tendo em vista os pilares da transparência, integridade e accountability, sendo esse último salutar na esfera pública.
Evidencia-se que a exigência de criação de um programa de integridade não fere a Constituição é uma ótima medida para evitar as práticas de corrupção e dar efetividade aos princípios inerentes de observação obrigatória pela administração pública.
Vejamos por fim, o que leciona Nascimento[4]
[…] o compliance público aponta para a concretização de uma estratégia inovadora para a esfera pública brasileira, tendo como fundamento os princípios da Administração Pública, previstos no art. 37 da Constituição da. República (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência)
Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
Por tais razões é importante e demonstra que o mercado Brasileiro, através da criação da lei anticorrupção e da criação do conceito de programa de integridade está efetivamente preocupado com as práticas ilícitas, contudo, deverá ser disseminada a ideia de que os entes federativos criem legislações mais específicas e normas a serem seguidas pelo Estado na criação do programa de integridade e quem seriam os necessários para fiscalizar a manutenção e inserção do programa, já que apenas possuímos legislação geral, e alguns Estados brasileiros já que as possuem mas até o momento sem muita efetividade.
3. CONCLUSÃO
Como parte do programa de compliance, a criação de um programa de integridade, é essencial como forma de suporte para evitar que venha a existir as penalizações contidas na lei anticorrupção visando coibir a práticas de ilícitos em desacordo com a legislação, ou mesmo prever possíveis danos ou consequência de atos praticados ou omissos, e afastar a responsabilização da empresa.
Os programas de integridade abarcam a criação de uma infinidade de ferramentas a serem desenvolvidas pela Empresa ou ente envolvido para dar efetividade a aplicação do código de ética e conduta, que trará políticas e diretrizes para a atuação, objetivando prevenir fraudes e atos de corrupção contra a administração pública e ainda a aplicação de sanções no seu descumprimento.
Nesse contexto, a exigência de sua criação apesar de não trazer atualmente penalidade a empresa que não implementar o programa de integridade, exigir sua implementação para contratar perante a administração pública, não soa inconstitucional visto que apenas vislumbra dar efetividade aos princípios constitucionais.
Para maior efetividade do programa e para a delimitação de entes e competências para fiscalização ainda se faz necessário que cada ente crie sua própria legislação para dar efetividade ao programa e para afastar discussões e possíveis arguições futuras de nulidade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Decreto nº 8.420 de 18 de março de 2015. dispõe sobre a responsabilização administrativa de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira e dá outras providências.
ZAGANELLI, Juliana Costa; MIRANDA, Wallace Vieira de. Marco civil da internet e política pública de transparência: uma análise da e-democracia e do compliance público. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 7, n. 3, p. 633-646, 2017.
NASCIMENTO, Juliana Oliveira. Panorama internacional e brasileiro da governança, riscos, controles internos e compliance no setor público. In: PAULA, Marco Aurélio Borges de; CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de (Org.). Compliance, gestão de riscos e combate à corrupção: integridade para o desenvolvimento. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 364
[1]BRASIL. Decreto nº 8.420 de 18 de março de 2015.
[2]BRASIL. Decreto nº 8.420 de 18 de março de 2015.
[3]ZAGANELLI, Juliana Costa; MIRANDA, Wallace Vieira de. Marco civil da internet e política pública de transparência: uma análise da e-democracia e do compliance público. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 7, n. 3, p. 633-646, 2017.
[4]NASCIMENTO, Juliana Oliveira. Panorama internacional e brasileiro da governança, riscos, controles internos e compliance no setor público. In: PAULA, Marco Aurélio Borges de; CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de (Org.). Compliance, gestão de riscos e combate à corrupção: integridade para o desenvolvimento. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 364
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)
PIASETZKI, Ana Claudia. Exigência de programas de integridade nas contratações públicas. Revista Di Fatto, Subcategoria Ciências Humanas, Direito, Nutrição, ISSN 2966-4527, Joinville-SC, ano 2024, n. 3, aprovado e publicado em 23/10/2024. Disponível em: https://revistadifatto.com.br/artigos/exigencia-de-programas-de-integridade-nas-contratacoes-publicas/. Acesso em: 24/04/2025.