A Tutela Jurídica da Educação sob a Perspectiva do Direito Público: desafios e garantias constitucionais

Categoria: Ciências Humanas Subcategoria: Direito

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Submissão: 01/11/2025

Autores

Juan Carlos Aguilar

Curriculo do autor: Formado em Direito, advogado licenciado, atualmente sou Servidor Público do Estado do Maranhão, trabalho na Procuradoria Geral de Justiça

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Resumo

O presente artigo tem por objetivo examinar a educação enquanto direito fundamental de natureza pública, prevista no artigo 205 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, como expressão da dignidade humana e instrumento de transformação social. A pesquisa parte da análise conceitual do Direito Público, delimitando-o como ramo jurídico que regula as relações entre o Estado e o cidadão, pautado na supremacia do interesse coletivo e na observância da legalidade. A partir desse marco teórico, aborda-se a evolução das políticas educacionais brasileiras, destacando a importância da atuação estatal na efetivação do direito à educação, especialmente quanto à acessibilidade, qualidade de ensino e formação docente. Examina-se, ainda, o papel das políticas públicas como mecanismos de concretização dos preceitos constitucionais e a necessidade de controle jurídico-institucional para assegurar a implementação efetiva de tais garantias. Conclui-se que a educação, além de constituir dever do Estado e da família, representa um direito fundamental de todos, cuja realização depende da harmonia entre a normatividade constitucional, a responsabilidade administrativa e a ação política contínua orientada à redução das desigualdades sociais.

Palavras-Chave

Educação. Direito Público. Políticas educacionais. Direito fundamental. Constituição Federal.

Abstract

This paper aims to examine education as a fundamental right of a public nature, as provided in Article 205 of the Federal Constitution of 1988, reflecting human dignity and serving as an instrument of social transformation. The study begins with a conceptual analysis of Public Law, defining it as the legal framework that regulates relations between the State and citizens, grounded in the supremacy of the collective interest and the principle of legality. From this theoretical basis, the research addresses the evolution of Brazilian educational policies, emphasizing the State’s role in ensuring the right to education, particularly regarding accessibility, teaching quality, and teacher training. It also analyzes public policies as mechanisms for implementing constitutional principles and the need for legal and institutional control to guarantee their effectiveness. The paper concludes that education, as both a duty of the State and a right of all citizens, constitutes a cornerstone of democracy whose fulfillment requires coordination between constitutional mandates, administrative responsibility, and continuous public policy aimed at reducing social inequalities.

Keywords

Education. Public Law. Educational policies. Fundamental right. Federal Constitution.

1. INTRODUÇÃO

A educação, no contexto constitucional brasileiro, assume papel central na consolidação do Estado Democrático de Direito, constituindo-se como direito fundamental de todos e dever solidário do Estado e da família, conforme preceitua o artigo 205 da Constituição da República de 1988. Trata-se de um direito de natureza pública, dotado de eficácia imediata e aplicabilidade plena, cuja concretização se projeta como instrumento essencial para o desenvolvimento da cidadania, a promoção da dignidade humana e a redução das desigualdades sociais.

Sob o prisma jurídico, o direito à educação integra o núcleo essencial dos direitos sociais e difusos, situando-se no campo do Direito Público, cuja função precípua é assegurar a supremacia do interesse coletivo sobre as vontades individuais. A educação, nesse sentido, não se limita ao processo de instrução formal, mas representa o meio pelo qual se efetivam os princípios da igualdade material, da justiça social e da inclusão, pilares da Constituição Cidadã de 1988.

A jurisprudência constitucional recente tem reafirmado a centralidade dessa garantia. No julgamento do Recurso Extraordinário nº 1008166/SC (Tema 548 da Repercussão Geral), o Supremo Tribunal Federal reconheceu que o direito à educação básica — em todas as suas etapas, compreendendo creche, pré-escola, ensino fundamental e médio — possui eficácia plena e aplicabilidade direta, impondo ao Poder Público o dever jurídico de assegurar seu acesso universal, inclusive mediante tutela judicial. Nessa oportunidade, o Tribunal assentou que o atendimento em creche e pré-escola para crianças de zero a cinco anos é um direito subjetivo da criança, exigível individualmente, e cuja omissão estatal configura violação direta à Constituição Federal.

De modo complementar, no Recurso Extraordinário nº 888815/RS (Tema 822 da Repercussão Geral), o STF delimitou as fronteiras do dever estatal e familiar na concretização do direito à educação ao decidir que o ensino domiciliar (homeschooling) não constitui modalidade de cumprimento lícito da obrigação educacional, por ausência de regulamentação legal específica. Embora a Corte tenha reconhecido que a Constituição de 1988 não proíbe o ensino domiciliar, concluiu ser indispensável lei formal que estabeleça critérios de fiscalização e avaliação, de modo a compatibilizar o interesse familiar com a função pública da educação e com o dever estatal de garantir a frequência e o controle de qualidade do ensino.

Essas decisões delineiam o equilíbrio entre a liberdade familiar de escolha e o dever jurídico do Estado de assegurar a educação como direito público subjetivo, refletindo a harmonia entre o artigo 205 da Constituição e os dispositivos complementares do artigo 208, inciso IV, e §3º. A partir dessa perspectiva, a efetividade do direito à educação depende não apenas de políticas públicas consistentes, mas também da atuação vigilante do Poder Judiciário, enquanto garantidor da supremacia constitucional e do controle de omissões estatais.

A análise que ora se propõe busca compreender a tutela jurídica da educação sob a ótica do Direito Público, examinando o papel do Estado na implementação das políticas educacionais, os limites impostos pela separação de poderes e as diretrizes fixadas pela jurisprudência constitucional contemporânea. O estudo, assim, pretende evidenciar que a concretização desse direito fundamental demanda um compromisso institucional permanente com a igualdade de oportunidades e com a realização material da dignidade da pessoa humana.

2. A ESTRUTURA JURÍDICA DO DIREITO PÚBLICO: FUNDAMENTOS E CARACTERÍSTICAS ESSENCIAIS

O Direito Público constitui o ramo do ordenamento jurídico destinado à regulação das relações entre o Estado e os particulares, orientado pela supremacia do interesse público e pela indisponibilidade dos direitos coletivos. Seu fundamento repousa na própria noção de Estado de Direito, em que o poder estatal é limitado pela lei e submetido aos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência, conforme estabelece o artigo 37 da Constituição Federal.

A gênese do Direito Público remonta ao constitucionalismo moderno, que surge como reação ao arbítrio absolutista, impondo freios ao poder político e estabelecendo garantias jurídicas em favor do cidadão. Assim, o Estado passa a ser concebido não apenas como detentor do poder coercitivo, mas como ente vinculado à tutela dos direitos fundamentais e ao cumprimento de finalidades públicas. Nesse sentido, o Direito Público tem por escopo assegurar a conformidade da atuação estatal com o ordenamento jurídico, sendo instrumento de contenção do poder e de efetivação da justiça social.

A doutrina distingue o Direito Público do Direito Privado a partir de critérios objetivos e subjetivos. Pelo critério subjetivo, observa-se a posição das partes na relação jurídica: no Direito Público, uma das partes atua investida de poder público e com prerrogativas de autoridade; no Direito Privado, as relações se desenvolvem em plano de igualdade. Já sob o critério objetivo, o Direito Público orienta-se por normas cogentes e de ordem pública, ao passo que o Direito Privado rege-se por normas dispositivas e de livre disposição das partes.

No magistério de Celso Antônio Bandeira de Mello, “o Direito Público é o conjunto de normas que disciplinam a atividade do Estado e sua relação com os administrados, tendo como princípio basilar a supremacia do interesse público sobre o privado e a indisponibilidade dos interesses coletivos” (Curso de Direito Administrativo, 35. ed., Malheiros, 2018, p. 45). Essa supremacia, contudo, não é absoluta, devendo ser exercida dentro dos limites constitucionais e sempre em observância à proporcionalidade e à razoabilidade.

A Constituição de 1988 elevou o Direito Público a um patamar de centralidade normativa, conferindo-lhe função instrumental para a realização dos direitos fundamentais e para a concretização do Estado Social. A partir dela, a atuação estatal passa a estar condicionada ao respeito aos direitos humanos e à promoção do bem comum, deixando de ser mero exercício de poder para se tornar dever de serviço à coletividade. O Direito Público, portanto, não apenas regula a conduta da Administração, mas orienta toda a dinâmica das políticas públicas, especialmente aquelas voltadas à concretização de direitos sociais, como a educação, a saúde e a moradia.

Na dimensão principiológica, destacam-se como fundamentos estruturantes do Direito Público: a legalidade, que vincula a Administração à lei e impede a atuação arbitrária; a supremacia do interesse público, que justifica o exercício das prerrogativas administrativas; a indisponibilidade do interesse público, que impede a renúncia a direitos e bens de titularidade coletiva; e a finalidade pública, que orienta todas as ações estatais à satisfação das necessidades sociais.

Com efeito, o Direito Público assume natureza garantista, pois protege o cidadão não apenas contra o abuso de poder, mas também contra a omissão estatal. Essa vertente garantista é reforçada pela atuação do Poder Judiciário, que, por meio do controle jurisdicional das políticas públicas, assegura a efetividade dos direitos sociais e impede que a ausência de ação administrativa inviabilize a realização do projeto constitucional.

Assim, compreender a estrutura do Direito Público é reconhecer que ele não se limita a um conjunto de normas regulatórias da função estatal, mas traduz a própria racionalidade constitucional que sustenta o Estado Democrático de Direito. É o ramo jurídico que dá concretude aos direitos fundamentais, estabelece os parâmetros da atuação administrativa e legitima o exercício do poder estatal em conformidade com os valores da justiça, da igualdade e da dignidade da pessoa humana.

 

3. A EDUCAÇÃO COMO DIREITO FUNDAMENTAL E INSTRUMENTO DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL

A Constituição da República de 1988 consolidou a educação como um dos pilares do Estado Democrático de Direito, reconhecendo-a simultaneamente como direito de todos e dever do Estado e da família, em conformidade com o artigo 205. Trata-se de um direito fundamental de caráter social, dotado de eficácia imediata, cuja finalidade não se restringe à mera transmissão de conhecimento, mas se estende à promoção da cidadania, da justiça social e da dignidade humana.

A educação assume natureza de direito público subjetivo, o que significa que sua concretização pode ser exigida individualmente perante o Poder Judiciário sempre que houver omissão do Estado em garantir o acesso universal e igualitário à instrução básica. Essa concepção foi amplamente afirmada pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 1008166/SC (Tema 548 da Repercussão Geral), ocasião em que se reconheceu que o dever estatal de assegurar vagas em creches e pré-escolas possui aplicabilidade direta e imediata, sendo incompatível com a omissão administrativa. Para o STF, “a educação infantil compreende não apenas o direito à matrícula, mas também o dever estatal de assegurar condições materiais adequadas ao desenvolvimento da criança”, sob pena de violação ao artigo 208, inciso IV, da Constituição.

Esse entendimento revela que o direito à educação não se confunde com um ideal programático ou mera diretriz política, mas constitui obrigação jurídica vinculante, cuja efetividade é indispensável à realização dos demais direitos fundamentais. Conforme leciona José Afonso da Silva, “os direitos sociais, entre os quais o direito à educação, têm por objetivo primordial criar condições materiais e espirituais que permitam a todos viver com dignidade e igualdade de oportunidades” (Curso de Direito Constitucional Positivo, 37. ed., Malheiros, 2021, p. 312).

O aspecto transformador da educação manifesta-se, portanto, no seu papel de instrumento de inclusão e emancipação social, sendo meio de concretização do princípio da igualdade substancial. A educação, ao permitir o desenvolvimento pleno das capacidades individuais, rompe barreiras históricas de marginalização e assegura a inserção ativa do cidadão na vida política, econômica e cultural do país. É, assim, vetor de desenvolvimento humano e condição indispensável à efetividade do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF).

No entanto, a efetividade desse direito exige a atuação harmônica entre os entes federativos e o respeito aos parâmetros fixados pela Constituição e pela jurisprudência. O STF, no Recurso Extraordinário nº 888815/RS (Tema 822), tratou da questão do ensino domiciliar (homeschooling), delimitando os contornos da liberdade familiar em face do dever estatal de garantir a educação formal. A Corte reconheceu que, embora a Constituição Federal não proíba o ensino domiciliar, ele não pode ser exercido sem regulamentação legislativa específica, por implicar riscos à fiscalização da qualidade do ensino e à observância do princípio da igualdade de oportunidades.

A decisão demonstra a compreensão de que o direito à educação ultrapassa a esfera individual da família, projetando-se como um dever público de natureza coletiva, que demanda controle social e institucional. A ausência de regulamentação do homeschooling não representa violação à liberdade familiar, mas expressão do compromisso do Estado com a universalização do ensino, a formação cidadã e a proteção integral da criança e do adolescente, conforme disposto no artigo 227 da Constituição.

Dessa forma, o sistema constitucional brasileiro estrutura o direito à educação sob um modelo de corresponsabilidade: cabe à família o dever de promover o desenvolvimento integral dos filhos, mas é do Estado a função de garantir o acesso, a permanência e a qualidade do ensino, mediante políticas públicas adequadas e fiscalização contínua. Essa repartição de responsabilidades revela o caráter bifronte do direito à educação, que, ao mesmo tempo, impõe obrigações positivas ao poder público e limitações negativas à omissão estatal.

Em síntese, a educação, como direito fundamental, transcende a dimensão pedagógica e alcança o núcleo da própria ideia de cidadania. Sua tutela jurídica, no campo do Direito Público, expressa o compromisso constitucional de transformar a realidade social pela via do conhecimento e da igualdade de oportunidades, reafirmando que o verdadeiro desenvolvimento nacional se constrói pela formação crítica, livre e plural de seus cidadãos.

4. A EDUCAÇÃO À LUZ DO DIREITO PÚBLICO E DAS POLÍTICAS CONSTITUCIONAIS DE EFETIVAÇÃO

O direito à educação, enquanto expressão do princípio da dignidade da pessoa humana e vetor de concretização da cidadania, encontra no Direito Público o seu principal instrumento de efetividade. A estrutura jurídico-constitucional brasileira confere à educação o status de direito social fundamental, de aplicabilidade imediata, impondo ao Estado não apenas a obrigação de respeitar tal direito, mas o dever positivo de promovê-lo mediante políticas públicas que assegurem acesso, permanência e qualidade de ensino em todos os níveis.

O artigo 205 da Constituição Federal de 1988 consagra a educação como direito de todos e dever do Estado e da família, devendo ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, ao preparo para o exercício da cidadania e à qualificação para o trabalho. Em complemento, o artigo 208 estabelece as garantias mínimas de prestação estatal, incluindo o ensino fundamental obrigatório e gratuito, a educação infantil em creche e pré-escola às crianças de até cinco anos e o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, em conformidade com o princípio da igualdade de oportunidades.

No julgamento do Recurso Extraordinário nº 1008166/SC (Tema 548 da Repercussão Geral), o Supremo Tribunal Federal reforçou o caráter vinculante dessas obrigações ao reconhecer que o dever do Estado de assegurar vagas em creche e pré-escola é juridicamente exigível, constituindo direito público subjetivo da criança. O Ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso, afirmou que “a educação infantil é um direito da criança, cuja efetividade independe de regulamentação ou de disponibilidade orçamentária, devendo o Poder Judiciário intervir quando houver omissão administrativa capaz de comprometer sua concretização”.

Tal entendimento reflete a aplicação da teoria da eficácia vertical dos direitos fundamentais, segundo a qual o Estado é o principal destinatário das normas constitucionais de proteção, sendo-lhe imposto o dever de agir positivamente para viabilizar a fruição material dos direitos sociais. Essa concepção reforça a função do Direito Público como instrumento de realização do bem comum, orientado pela supremacia do interesse coletivo e pela máxima efetividade das normas constitucionais.

Nesse contexto, as políticas públicas educacionais configuram o meio pelo qual o Estado concretiza o conteúdo normativo da Constituição. Conforme observa José dos Santos Carvalho Filho, “as políticas públicas constituem a atuação concreta da Administração na execução de programas e ações voltadas à satisfação das necessidades essenciais da coletividade, e sua implementação é obrigação jurídica e não mera faculdade discricionária” (Manual de Direito Administrativo, 37. ed., Atlas, 2024, p. 58). Assim, a omissão na execução dessas políticas caracteriza afronta direta ao princípio da legalidade e pode ensejar controle judicial corretivo.

O Supremo Tribunal Federal, em sucessivos precedentes, tem reafirmado a possibilidade de intervenção judicial em políticas públicas quando constatada a inércia do poder público em assegurar direitos fundamentais. Esse controle, no entanto, deve respeitar o princípio da separação dos poderes, limitando-se à determinação de cumprimento das obrigações constitucionais, sem substituir a discricionariedade técnica e orçamentária da Administração. Trata-se, portanto, de uma atuação corretiva e subsidiária, voltada à concretização da Constituição e não à formulação de políticas públicas propriamente ditas.

Ao lado do Poder Judiciário, o Ministério Público exerce papel essencial na efetivação das políticas educacionais, especialmente por meio da tutela coletiva e do controle de legalidade. A Lei nº 7.347/1985, que disciplina a ação civil pública, confere legitimidade ativa para a defesa do direito à educação enquanto direito difuso, permitindo a atuação do Parquet na fiscalização das obrigações estatais e na propositura de medidas judiciais que visem assegurar a universalização do acesso ao ensino e a melhoria de sua qualidade.

O Direito Público, portanto, opera como sistema de garantias que assegura a concretização dos fins constitucionais da educação. A supremacia do interesse público, quando interpretada à luz da função social do Estado, impõe ao poder público o dever de adotar medidas efetivas que concretizem os valores fundantes da Constituição, em especial a igualdade de oportunidades, a redução das desigualdades regionais e a promoção do desenvolvimento humano sustentável.

Em última análise, a efetividade do direito à educação depende de uma atuação estatal comprometida com a eficiência administrativa, a boa governança e o planejamento racional das políticas públicas. O Estado deve transcender a lógica meramente formal de previsão normativa e concretizar o conteúdo substancial do direito, assegurando que o acesso à educação pública de qualidade não seja privilégio, mas expressão concreta da cidadania e da justiça social.

Com base na versão consolidada do seu TCC e nas jurisprudências contemporâneas sobre o dever constitucional do Estado em assegurar o acesso universal à educação infantil, apresento a seguir o tópico final — “Conclusões: Reflexões sobre o Direito à Educação e a Efetividade das Políticas Públicas”, redigido de modo técnico e formal, com fundamento nos precedentes do Supremo Tribunal Federal (RE 1008166/SC – Tema 548) e na análise doutrinária do papel do Direito Público como instrumento de concretização das políticas educacionais.

5. CONCLUSÕES: REFLEXÕES SOBRE O DIREITO À EDUCAÇÃO E A EFETIVIDADE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

O exame do direito à educação sob a ótica do Direito Público evidencia que sua efetividade transcende a dimensão programática e assume natureza de dever jurídico vinculante, imposto ao Estado em todas as suas esferas federativas. A Constituição de 1988, ao reconhecer a educação como direito social de todos (art. 6º) e dever solidário do Estado e da família (art. 205), confere-lhe caráter de direito fundamental de aplicabilidade imediata, cuja concretização não pode ser postergada sob o argumento de limitações orçamentárias ou discricionariedade administrativa.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal consolidou essa compreensão ao firmar, no Tema 548 da Repercussão Geral (RE 1008166/SC), que o dever estatal de assegurar vagas em creches e pré-escolas constitui direito público subjetivo da criança, de modo que a omissão administrativa autoriza a intervenção judicial para garantir a matrícula e o acesso à educação infantil. Tal entendimento reafirma que a educação básica, em todas as suas fases, é direito fundamental de eficácia plena e aplicabilidade direta, e que os Municípios detêm a responsabilidade primária por sua concretização.

A análise integrada entre as políticas públicas e o Direito Público revela que a inefetividade das ações estatais no campo educacional ainda representa um dos maiores desafios para a consolidação de uma sociedade democrática e igualitária. A ausência de investimentos consistentes, a precariedade estrutural das instituições de ensino e a insuficiência de políticas inclusivas comprometem o cumprimento do mandamento constitucional de promover educação de qualidade para todos. Assim, o controle judicial e a atuação do Ministério Público assumem relevância instrumental na correção de omissões e na exigência de observância das metas previstas na legislação educacional.

O Ensino Domiciliar (homeschooling), por sua vez, foi analisado pelo STF sob o RE 888815/RS, ocasião em que se reconheceu que, embora a Constituição não o proíba expressamente, sua implementação depende de regulamentação legislativa que assegure mecanismos de avaliação e fiscalização. A decisão reforça o equilíbrio entre a liberdade familiar e o dever estatal de zelar pela formação integral da criança, evidenciando que o direito à educação é um dever compartilhado, mas sob a tutela do Estado como garantidor da universalidade e da qualidade do ensino.

Em perspectiva final, observa-se que a efetividade do direito à educação não pode ser compreendida apenas sob o prisma formal, mas como um compromisso ético-jurídico do Estado com o desenvolvimento humano, a igualdade de oportunidades e a justiça social. O Direito Público, ao submeter o poder político ao império da Constituição, assegura que o acesso à educação deixe de ser privilégio e se torne condição essencial de cidadania, transformando-se em instrumento de emancipação e fortalecimento do Estado Democrático de Direito.

Portanto, a concretização do direito à educação depende de uma articulação contínua entre os princípios constitucionais, as políticas públicas e o controle jurisdicional, de modo que se alcance, progressivamente, a universalização do ensino com qualidade, igualdade e respeito à dignidade da pessoa humana — núcleo axiológico de todo o sistema jurídico brasileiro.

REFERÊNCIAS

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

Aguilar, Juan Carlos. A Tutela Jurídica da Educação sob a Perspectiva do Direito Público: desafios e garantias constitucionais. Revista Di Fatto, Ciências Humanas, Direito, ISSN 2966-4527, DOI 10.5281/zenodo.17506592, Joinville-SC, ano 2025, n. 5, aprovado e publicado em 02/11/2025. Disponível em: https://revistadifatto.com.br/artigos/a-tutela-juridica-da-educacao-sob-a-perspectiva-do-direito-publico-desafios-e-garantias-constitucionais-2/. Acesso em: 13/12/2025.